quinta-feira, 22 de dezembro de 2011

MARY- AMIZADE ALÉM DA VIDA

Esta é a história de uma grande amizade.
Amizade que transcende os limites entre a vida e a morte! Somente o amor pode atravessar este abismo !
Uma história que poderia começar assim:
Era uma vez uma menininha muito frágil, delicada, feliz!  Mas se sentia muito só! Queria muito uma irmã para brincar com ela.
Em sua imaginação criou essa irmãzinha que a acompanhava em todas as brincadeiras, para quem ela contava estórias, que fazia dormir...até que um dia, não era mais imaginação...

Marydel, Mary, Delzinha!  Assim se chamava minha irmã de alma, que me ensinou a amar as crianças, a valorizar cada momento vivido, a confiar em mim, a nunca "varrer a sujeira para baixo do tapete".
Ensinou-me a enfrentar a realidade de frente -acho que isso não aprendi muito bem...-
Ensinou-me o verdadeiro sentido da vida, do Amor!
Deixou em meu coração uma saudade quase insuportável, que me faz chorar a uma simples lembrança.


Todo ano, ela e a tia Armonia, vinham a Lorena para as Festas de Natal e Ano Novo, mas nunca acontecia de nos encontrarmos. Eu estava completando quinze anos,  tia Armonia resolveu fazer o meu bolo de aniversário e levou a Delzinha.
Daquele dia em diante minha vida tomaria um outro rumo.


Armonia, sem H, era  uma das mais doces e queridas pessoas que já conheci, e nunca vi um nome que combinasse tanto com alguém, seu riso farto enchia o ambiente, sua paz e alegria contagiavam.


Eu já  havia visto a Delzinha na cidade, com uma outra parente distante,  achei-a "antipática".
Ainda bem que ela não soube disso (nem ninguém, pois só agora  confesso)  e assim  pude conhecê-la melhor e usufruir do encanto de sua personalidade, da sabedoria de um ser que certamente não pertencia a este mundo.


Ainda naquela semana  viajei com elas para Campinas e depois para Piracicaba...Foi o início de algo muito novo para mim.
Ela era nove anos mais velha que eu, e muito brava. Lembro-me das "broncas" que  levava por causa das minhas criancices.
Como nós brigávamos! Mas como nos divertíamos também!



 Viajávamos, passávamos quase três meses juntas nas férias escolares e ao final deste período, lembro-me que ela não queria se despedir, escondia-se para chorar!
Durante todo o ano escrevíamos longas cartas uma para a outra.
     

Quanta coisa aprendia com ela, eu admirava sua força de vontade, me encantava com seus ideais, adquiria valores e conhecimento de vida ...
A  Delzinha era o ídolo da minha adolescência!
Lembro-me, particularmente,  de uma viagem que fizemos à Londrina, no Paraná, fomos de trem,  bastante confortável, mas como em todo começo de ano, chovia muito.  Naquele dia houve queda de barreiras sobre os trilhos e nós  passamos vinte e duas horas dentro do trem.
A paisagem era maravilhosa, o trem passava em meio a plantações que se perdiam de vista.  Parecia uma viagem de sonhos, tal a beleza dos campos cultivados misturados à mata nativa.
Além de tanta beleza, acho que nunca me diverti tanto  com a Delzinha, com a tia Armonia e com o tio Américo.



                                 

Tio Américo, pai da Delzinha, era um baiano cheio de manias,  engraçado, cantarolava o dia inteiro. Sempre de bom humor, simpático, mas acima de tudo, como todo bom baiano, era muito inteligente.
E como! 
Sendo menino pobre, na Bahia, muito cedo precisou trabalhar e não frequentou escolas, o que não o impediu de adquirir um conhecimento fora do comum.  Foi ele quem   preparou seus filhos para os vestibulares. Exemplo de superação, era também um dos nossos "Pracinhas".
Dele também tenho lembranças maravilhosas, e grandes lições de vida.

Lembrei-me agora de um caso ocorrido logo após o tio Américo falecer.
Ele, como disse acima, vivia cantarolando e na época a música que mais cantava, era "Rosas vermelhas para uma dama triste" (  Red  roses  for  a blue  Lady ) http://youtu.be/VhJo7xfAvwI


                          


Aconteceu de entrarmos numa lanchonete e a Delzinha foi ao caixa comprar as fichas, fiquei no balcão onde um dos garotos que serviam, estava alegremente a cantar essa música. Estremeci... e se ela ouvisse?... Iria ficar triste com a lembrança do pai... eu não queria que ela ficasse triste!     Pedi  ao rapazinho que parasse de cantar! Não havia tempo para explicar porque, mas ele ficou bravo, disse que eu não mandava nele!
Quando ela chegou ao balcão nos encontrou brigando, nada entendeu e eu levei mais uma bronca.  Ela nunca soube o porque daquela briga com um completo estranho.                     

E assim se passaram muitos anos...    
Com nossos casamentos acabamos por nos afastar um pouco, mas o sentimento que nos unia não diminuiu. Sempre nos comunicávamos. Ela era agora minha comadre!
Comadre Delzinha, não posso conter minhas lágrimas ao chamá-la assim!

Tia Armonia, eu , a  Delzinha e nossos pequenos     
                                                                                                                         
 "No Amor, fiquem juntos, mas não tão juntos, pois os pilares do templo ficam bastante afastados e o carvalho e o cipreste não crescem na sombra um do outro"
                                                                                             K. Gibran


Um dia, que ainda me lembro como se fosse hoje, ela me ligou, dizia ter encontrado um nódulo no seio, sua voz estava cansada, parecia respirar com dificuldade.
Não pude acompanhar de perto sua doença.  Nesta época eu lutava para salvar meu casamento, não dei a ela o apoio que de mim talvez esperasse. Isto até hoje machuca meu coração.



Foi assim que no final de um determinado dia, estava fechando minha loja, quando recebi sua ligação.
Dizia que se eu deixasse para ir vê-la depois que se fosse, não precisaria ir.
Senti como se houvesse levado um golpe no estômago, não conseguia pensar em mais nada, lágrimas rolavam livres em meu rosto. Era  uma dor que parecia não caber dentro de mim...
Corri em casa, arrumei algumas peças de roupa numa mala e embarquei no primeiro ônibus para Belo Horizonte, onde ela morava.
Viajei durante toda noite,  cheguei á rodoviária ainda não havia amanhecido. Enquanto esperava que me viessem buscar a angústia me oprimia.
Mas quando  minha amiga acordou pela manhã, eu estava a seu lado.

  
  Passamos aquele dia relembrando nossas vidas,  estava feliz,  parecia reagir.
No dia seguinte, fomos ao hospital, para que recebesse uma transfusão de sangue, que ela não queria, demonstrava  fragilidade, medo...
Quando voltamos à casa, estava excessivamente cansada.
Tia Armonia fez uma sopinha e eu tentei dar a ela.  Nesse momento começou a passar mal,  percebi que algo terrível acontecia.
Peguei-a nos braços, tirando forças não sei de onde, desci as escadas desesperada,  o coração descompassado, corri para o carro. Nós a levamos ao hospital, seu corpo estava inerte.
Pedia à Deus que reagisse!
Tentava me enganar,  mas creio que já estava morta.

Parece que ela estava a minha espera para ir embora, para fazer sua Grande Viagem!
Também na morte ela ainda me ensinou mais uma lição:
Pensamos que temos todo tempo do mundo, mas a vida não espera! 
Se amamos alguem precisamos cuidar desse amor hoje, agora, amanhã poderá ser tarde demais!


Esta, Marydel, é uma pequena e simples homenagem que lhe faço, perto da imensa saudade que você deixou, não só em mim, mas em todas as pessoas que a conheceram.
Por tudo que nos ensinou, por todas as inúmeras crianças que você orientou e amou, Deus a abençoe!
Fique em paz... e até um dia...!

"A gente corre o risco de chorar um pouco quando se deixou cativar..."
Antoine de Saint- Exupéry

7 comentários:

  1. Ah, Sidnéa!! Sei como é ver quem amamos partir! A dor da saudade é imensa pois sabemos que não vamos mais encontrá-la. Está corretíssima ao afirmar que achamos que temos todo o tempo do mundo e protelamos as nossas demonstrações de afeto. Coração ficou pequenininho em meu peito, mas também tenho por mim, que até mesmo o sofrimento, nos serve de ensinamento. Teve alguém especial em sua vida que soube trocar com você experiências e sentimentos cativos. Para a alma, a morte não existe!

    O natal se foi, mas espero que seu espírito se mantenha, durante todo esse próximo ano que chega, te trazendo sempre paz, alegria e enxotando as tristezas de sua vida!!

    Beijus,
    Boas férias!
    Beijus,

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  2. Eu(pedro flavio) tinha um ano de vida guando minha família mudou-se para a casa vizinha de Da.Armonia. Dai a amizade só se fortaleceu, haja vista minha irmã"Anarosa" ter escolhido a Delzinha como sua madrinha de crisma. O tempo passou,mas as visitas eram muito constantes . Para resumir, depois de bom tempo bem distante, eis que reencontro a Delzinha em Belo Horizonte. Logo fui com a família fazer uma visita para apresentar meus filhos e conhecer o seu marido e seus filhos. A Da. Armonia estava lá e me contou que s Delzinha estava muito mal de saúde e eu fiquei muito triste com a situação e em curto espaço de tempo ela se foi...não pude ir ao velório pois não estava em BH. Porém é inevitável as lembranças de importantes momentos de uma época muito boa de nossas vidas.saudades...

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    1. "Pefla", se não me falha a memória era assim que o chamavam, um menino especial, tímido! Delzinha me levou para conhecer sua família, encantei-me com sua mãe, D. Olga,, lembro-me bem da Anarosa, do José Eraldo...,para mim era uma alegria muito grande visitá-los,Bons tempos! Também tenho saudades, mas sei infelizmente que não temos mais estas pessoas queridas entre nós. Tia Harmonia também há tempo nos deixou.´Não pude me despedir dela. Por toda a minha vida vou chorar estas perdas.Você não imagina a emoção que me causou o seu comentário, Pedro Flávio! Gostaria que fosse possível fazer voltar o tempo, mas ao menos poderíamos não perder esse contato.Saudades, muitas saudades! Obrigada,, Um grande abraço

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  3. Obrigado pelas palavras e lembranças, minha mãe gostava muito de você e eu digo gostava pois nos deixou há um mês (em janeiro ia completar 100 anos). Eu já aposentado, com três filhos e dois netos vou levando a vida. Espero que você e sua família estejam bem também. Fiquei muito feliz com esse nosso contato e espero que continue.bjs.

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  4. Pensava que D. Olga havia falecido há mais tempo, Poderia ter ido visitá-la, minha irmã mora em Itatiba e sempre vou à Campinas! Sinto muito! Soube que o Eraldo também se foi!
    Eu estou bem, tenho 4 filhos, uma "penquinha" de netos, aposentei-me como professora, vivo num sítio em Lorena, às vezes estou em Ubatuba com minha mãe, também vou "levando a vida". Espero, como vc que não percamos esse contato. Grande abraço!

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  5. A minha mãe tinha uma saúde de ferro e com essa idade toda ainda andava,lembrava de tudo e continuava brava como sempre foi porém, uma infecção urinária progrediu para os rins e foi fatal. Quanto ao Eraldo esteve muito mal e felizmente sarou,hoje está bem. A Anarosa e a Maria Olga também com boa saúde. Fico feliz em saber que com você também está tudo bem.Abs.

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  6. Que bom saber que todos estão bem. Tia Armonia havia dito que o Eraldo tinha falecido! Saúde pra ele! Lembranças a todos, Pedro Flávio, estou mt feliz em reencontrá-los! Existe uma frase, que um grande amigo sempre diz, cujo autor desconheço, mas ilustra bem: "Quanto mais longa a ausência, maior é o fascínio do reencontro". Meu Facebook encontra-se no blog, terei prazer em adicioná-lo. Grande abraço a todos.

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